sábado, 13 de junho de 2009
Documentário sobre Sam the Kid: Dicas no vinil
Dicas no vinil
O Sam é um case study. A sociedade condiciona-nos e a pressão colectiva geralmente é autoritária ao influenciar o que devemos fazer, como fazer, como devemos viver e quais os critérios que nos validam.
O Sam fez a rota dele sem manual e seguidismo e parece ter um escudo sobre ele, que o torna imune aos "quereres" e "precisares" das pessoas banais, porque optou viver religiosamente em prole do ideal de perseguir melodias e batidas. E esse mesmo ideal moldou a sua filosofia de vida, tornando-o numa das pessoas mais originais e autênticas que alguma vez conheci: Quando a maioria das pessoas se vai deitar é nessa altura que o Sam pica o ponto, calça as luvas operárias e vai trabalhar na caixa de ritmos, é à noite que ele cria. Diz-me que não lê e não tem hábitos literários mas é mentira, não conheço pessoa que tenha lido mais revistas de hiphop, sources, elementals etc...Ele tinha um caixote à porta de casa com centenas de revistas, uma autêntica biblioteca de hiphop, também já o apanhei a ler a ocasional revista "cor de rosa" que a Mãe dele tem o hábito de comprar. Não tem, nem está muito preocupado em ter carta de condução. Raramente sai, um autêntico eremita com hábitos isolados e solitários. Não tem internet e sabe tudo que se passa antes de todos os outros. Mas isso tudo são pormenores até passares algumas horas com ele, porque é aí que te apercebes, tal como o NBC disse no documentário, que essa filosofia de vida, essa forma de viver ao contrário da sociedade em nome da musica, vem...sem esforço. Naturalmente. Muitos esforçam-se pra ser artistas, o Sam é artista visceralmente e quem tá de fora acha que essa noção parte do seu génio para a criação de instrumentais. Mas isso é apenas uma fatia do bolo, a obcessão em filmar coisas memoráveis, a atenção para o detalhe, as dicas com se sai em determinadas conversas, os seus interesses e desejos íntimos, a forma como cospe as rimas, a sua postura e personalidade fazem dele um Artista. Sam é realizador, crate digger noctívago, produtor, Mc mas a soma de todas as partes cria uma dica mesmo especial.
Todos os amigos dos Sam têm um "momento clássico do sam" pra contar, quer isso derive da música ou da forma peculiar como vive e das peripécias de que dái advêm.
O meu veio quando cuspimos juntos em 07 na faixa "tributo". Tinha um exame saí da faculdade já atrasado e quando cheguei à casa do xeg ao rendez-vous, o Bob já tinha cuspido o verso dele assim como o Sam. E só soube que tinha perdido uma coisa especial quando o Sam decidiu que a voz dele não tava fixe e tinha de regravar. No dia da re-gravação do verso experiênciei uma cena que mudou o meu percurso de Mcing pra sempre. A intensidade com que ele regurgitava as palavras, as dobras, a energia que ele impria e as caretas que acompanhavam cada silaba foi uma dica que nunca tinha visto. Depois disso abriu-se uma nova porta pra mim que eu nem sequer imaginava que havia em termos de execução de rap. Eu sempre fui fã de passar emoção nas tracks, o Eminem sempre me excitou bué a nivel de interpretação e ver o Sam a fazer aquilo foi mágico. Daí a concluir que o Sam não é apenas um produtor genial mas um dos rappers mais dotados também, e essa combinação é fenomenal.
No outro dia ouvia o kweli a ser entrevistado e ele estava a descrever como o J.dilla criava, descreveu episódios da sua obcessão musical, processo e carinho na confeição dos beats, e eu pensei pra mim próprio "damn é que como se ele estivesse a falar do sam". Impressionante.
Salvamarte
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Um comentário:
O documentário é interessante precisamente para se conhecer a faceta do Sam que está vedada à maior parte das pessoas, ou seja, quais são as suas rotinas, o seu método de criar, etc.
De facto, o admirável percurso do Sam torna-o alguém muito especial não só no Hip Hop mas na música portuguesa em geral.
Gostei do que li.
Um abraço.
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